SÃO PAULO – “Ainda vivemos num mundo em que competir está em moda, embora se precise cada vez mais de trabalho em equipe. Identificar quem são os sabotadores requer, antes de mais nada, conhecimento das próprias habilidades e competências, para avaliar se há sabotagem, discriminação, ou algo do gênero”.
A explicação é do diretor-executivo do Insadi (Instituto Avançado de Desenvolvimento Intelectual), Dieter Kelber. Os sabotadores de carreira podem ser tanto chefes quanto colegas de trabalho do mesmo nível hierárquico. São pessoas que não desejam o crescimento profissional de seus alvos e colocam a si mesmas em primeiro lugar, sempre.
Kelber define o sabotador da carreira alheia como um profissional incompetente. “Quando há pessoas assim na organização, quem deve ser penalizado, e até mandado embora, é o superior imediato, que tolera esse tipo de atitude. Alguma competição é até conveniente, mas dentro dos níveis da ética e do respeito”, diz ele.
“Por mais calculista que seja, o sabotador de carreira é um desajustado, que vai arcar um dia com o seu próprio blefe. Talvez a forma mais usual de eles atuarem seja usando de fofocas e mentiras. Mas a quem convencem com essas fofocas e mentiras? A chefes incompetentes?”, questiona.
Identificando os sabotadores
Para a diretora da consultoria de imagem RMML, Renata Mello, é possível identificar os sabotadores de carreiras, embora muitos deles ajam de forma sutil.
“Os sabotadores dificilmente fazem elogios; demonstram que nada do que você faz é bom o suficiente; quando você pede para ser promovido, dizem que o momento ainda não é o ideal; e não querem que você brigue além do necessário. A cada braçada que você dá, eles te brecam”, opina a especialista em etiqueta profissional.
Ela explica que há chefes que são inseguros e, por isso, acabam sabotando, conscientemente ou não, os próprios subordinados. “Quando o funcionário tenta fazer algo para melhorar, esse tipo de chefe passa a mão na cabeça dele, dando a entender que ele não consegue fazer sozinho. Mas o profissional que se sente desvalorizado deve entender que, às vezes, o problema não é ele, e sim o chefe”.
Falsos amigos
O problema, na opinião de Renata, é que há sabotadores que agem de forma muito sutil, quase imperceptível. Na frente do alvo, parecem bons amigos. Pelas costas, a lógica se inverte. “São colegas que se fazem de amigos, nunca falam mal pela frente, mas, quando são questionados, logo apontam o dedo. Além disso, não dão o crédito devido às pessoas. Pegam um projeto alheio, apenas revisam e dão a entender que foram os responsáveis por ele, deixando claro que o outro só fez a parte operacional”.
Ela conta o caso de um trainee que havia elaborado um projeto e mostrado ao seu gerente. Este adorou e foi logo para a diretoria apresentá-lo, sem levar o trainee consigo, como se tivesse sido o responsável pela idéia. Porém, os diretores começaram a fazer várias perguntas, que o gerente não soube responder. No fim das contas, foi preciso chamar o trainee, que, não só respondeu as perguntas, como deu um show de apresentação. “Conclusão: o trainee foi promovido, e o gerente se queimou”.
Como se proteger
Na avaliação de Renata, para se proteger do sabotador, ainda que ele seja do tipo sutil, é preciso conversar direta e abertamente. Agora, se o sabotador é o próprio chefe, a situação é um pouco mais complicada. Uma saída pode ser traçar um plano de metas de curto prazo e dividi-lo com o superior. Diga que, caso atinja as metas, espera ser reconhecido. Além disso, se possível, peça que as avaliações de desempenho sejam realizadas com intervalos mais curtos do que o normal, como de dois em dois meses.
Competência funciona como blindagem
Dieter Kelber, do Insadi, defende outra maneira de se proteger: “sendo competente, muito mais competente que eles [os sabotadores]“. Segundo disse, com competência, consegue-se melhorar continuamente, agregar valor aos clientes externos e internos e melhorar a cadeia de valor da organização. “Não precisamos ser campeões naquilo que fazemos, mas precisamos ser bons”, aconselha.
“Fazer reuniões pode ajudar. Tirar tudo a limpo é sempre útil em qualquer situação, em qualquer relação, porque a dúvida corrói e nos faz sofrer. Mas até para esclarecer temas polêmicos, temos de ter competência”.
Ele explica: “Somos realmente eficientes e eficazes suficientes para galgar mais degraus em nossa carreira? É preciso tomar cuidado para que o feitiço não vire contra o feiticeiro. Temos a tendência de colocar a culpa nos outros quando, na realidade, ela está em nós mesmos. Não podemos ter postura de vítima nessas horas. É preciso avaliar se você está preparado para receber uma verdade”, diz ele.
Kelber afirma que profissionais competentes dificilmente são sabotados. “As empresas não funcionam sem pessoas competentes. Há sempre uma certa tendência de se afirmar que há politicagem nas empresas. Sim, ela existe, mas não nos níveis maquiavélicos que muitos imaginam. Nenhuma empresa sobrevive de politicagem. Os clientes não querem saber de politicagem, e sim da qualidade dos serviços e produtos fornecidos. Quando somos competentes naquilo que fazemos, dificilmente teremos nossa carreira sabotada”.
Chefe sabotador? Mude de emprego!
É mais difícil se proteger de um sabotador que é o próprio chefe, mas bem que você tentou. Além de ter trabalhado com afinco e competência, conversou com quem insiste em te prejudicar. Não deu certo? Esteja aberto a novas oportunidades e comece já a procurar um novo emprego, recomenda Renata. A lógica diz que, se, em determinada empresa, seu talento não é aproveitado, certamente em outra organização ele será.
“Se o chefe é um sabotador, é porque o chefe é um incompetente. Se o chefe do chefe for incompetente, então você pode começar a concluir que está numa empresa de incompetentes. E se você não for incompetente, estará na empresa errada”, afirma Kelber.
Sabotagem ou teoria da conspiração?
Kelber alerta que, muitas vezes, a afirmação “estou sendo sabotado” soa como desculpa de nossa própria ineficiência. “A questão é descobrir quem é incompetente. Você ou os outros? Acho que temos que mudar de empresa, de trabalho, quando percebemos que não gostamos daquilo que estamos fazendo. Quando realmente sabotam nossa atuação, e conseqüentemente nossa carreira, há uma grande probabilidade de estarmos fazendo coisas que não gostamos”, diz ele.
Os verdadeiros puxadores de tapete
Mas quem puxa o tapete de quem? Já parou para pensar que há “puxadores de tapete” mais perigosos e que nem sempre trabalham conosco?
“Acho que, na verdade, quem puxa o tapete de quem não trabalha direito são os clientes ou acionistas. E nenhum deles vai querer puxar o tapete de uma pessoa competente. Ora, se estou trazendo resultados para a empresa, para que vão querer puxar o meu tapete?”, finaliza o diretor-executivo do Insadi.